21 de maio de 2006

Expulsando demônios

Nunca tive pretenção em ser escritora, e continuo não tendo. Postei aqui algumas coisas que escrevi entre 1994 e 1995, quando escrever aliviava um pouco meus medos adolescentes. Lendo-os tantos anos depois, ainda me reconheço em alguns trechos, mas só em alguns. Fico feliz em perceber que doi menos. Ainda resta um pouco da adolescente tímida que fui, mas sem todo aquele complexo de inferioridade. Ainda sinto o peso da solidão, apesar de gostar tanto dela. É estranho, ainda hoje me sinto profundamente atraida por ela, mas ao mesmo tempo a temo; e agora, acho que ainda mais que antes. Por isso, nada impede que coloque aqui algo atual.
Não sei como classificá-los, não é poesia, nem dissertação, são na verdade desabafos, sem pontuação, sem rima, sem métrica. São "palavreados", apenas a forma que encontrei para expulsar de dentro de mim, demônios que me atormentam. 
  
Palavreado: s.m. Reunião de palavras sem muito nexo ou importância.

Só, caminho

Caminho calada,
olhos baixos,
olhos rasos.
Pensamento atormentado

Caminho à vontade,
mas sem vontade.

Caminho só eu,
sempre, e sempre...

Caminho nas pedras, 
na grama,
no alfalto.

Caminho com rumo,
caminho com direção.

Caminho sem dar importância
ao sol, à chuva, ao vento.

Caminho porque minhas pernas
sabem onde tenho que ir.

Só, caminho,
sem coragem de pedir à vida,
que me faça companhia.

escrito em 01/10/2011

Tudo que sinto

Que dor é essa que corrói o meu ser,
desilude minha alma,
maltrata minha carne.

Cada vez mais a sinto,
inteira, forte, decidida.

Cada vez menos,
sinto vontade de agir,
de lutar,
de vencer.

Sinto, sim
e tudo que sinto,
é dor.

Dói ao amanhecer,
e a cada minuto do dia.

Dói à noite também,
mas ela me é mais amiga,
acolhe as lágrimas,
permite o desabafo.

Dói dentro o que queria
que doesse fora.
Mas fora não dói.

Dói a alma, 
cada vez mais vazia.
E ela me impede de sonhar.

E o que somos nós,
se desistimos de sonhar?

Uma sombra,
uma névoa fria,
uma alma inquieta,
uma única e infinita dor.
escrito em 01/10/2011

Torrente de dúvidas

Encontros e reencontros tiram-me
do curso seguro que trilhei
e o silêncio me tem sido necessário.

Aqui dentro algo revira, 

algo vira, desatina.  
Como um nó que afrouxa e aperta
sem que eu consiga desfazê-lo.

Tenho tentado ignorar o que me machuca
na vã esperança de que a alegria do imaginado
seja mais forte, mais vivo.

Sem chão, sem rumo, tudo incerto
Só desejo  a segurança perdida depois daquele encontro,
mas o tempo passa sem que se apague aquela presença.

É como um encontro de almas 

que dura apenas uma fração de segundo, 
apenas um olhar sem palavras,
mas o suficiente para tornar 

todas as certezas e definições,
uma torrente de dúvidas.

escrito em 16/09/2011

Solidão é tudo que resta

Minha alma em deserto,
procura e não encontra,
o que a faz completa,
nem o que a liberta.

A noite longa e pesada
arrasta para o dia,
o vazio da alma.

Minha alma é um deserto,
cercado de almas pesadas
que se arrastam noite e dia, 
sem a alegria sonhada.

A cada noite, a cada dia
o deserto aumenta,
levando de minha alma,
o que ainda lhe resta.

escrito em 11/09/2011

Caminho do Abismo

Criamos monstros dentro de nós
capazes de tudo para se fortalecerem.
São demônios que querem minha alma.
Planejam mil situações para que eu 
fique deprimida e atacam.
Atacam com forças que eu mesma forneço.
Esse monstro está ficando mais forte.
Preciso de ajuda.
Mas não sei como conseguir.
Ele está me atacando com forças que eu mesma forneço.
Estou com medo de ser vencida.
A cada hora ele se torna mais forte.
E eu, mais fraca, não sei como derrotá-lo.
Talvez os amigos possam ajudar.
E se forem eles os monstros?
Não posso confiar em ninguém.
Mas de que isso adiantaria.
Não tenho amigos vivos, 
apenas conhecidos.
Ele está me atacando com forças que eu mesma forneço.
Estou ficando sem resistência, ele está me atacando e 
não tenho forças para me defender.
Até quando vou resistir.
Até quando?
?


escrito em 03/08/1994

Momentos (previsões)

A vida se torna fria demais quando se tem que ficar sozinho.
Amigos as vezes são inimigos.
Como saber se são amigos?
Talvez algum dia iremos saber.
Mas por enquanto estou dividida.
A vida é assim, 
totalmente imprevisível.
Momentos imprevisíveis, as vezes 
com consequencias  previsíveis demais,
mas nunca realmente satisfatórios.
Parece que temos sempre um dia a mais 
ou uma noite a menos.
E o maior problema de nossa vida,
é "nossa vida", vivida errada.

escrito em 03/08/94

Íntimo de um insatisfeito

Escrever é melhor que falar.
Com as palavras não se vê os olhos.
Não é necessário a presença.
A fala exige muito,
Mas dentro de mim parece tudo tão fácil,
tão certo,
tão como eu sonho.
Mas o sonho é a diferença.
Meus sonhos não passam de sonhos, 
de imaginação. 
Imaginação fértil a minha.
Quem seria capaz de viver 3 vidas diferentes,
mais a realidade?
Só alguém insatisfeito e amedrontado
com a própria realidade. 

escrito em 19/04/95